quarta-feira, 3 de dezembro de 2014

Uma novela das boas

AS MINHAS ÚLTIMAS HORAS FORAM UMA VERDADEIRA NOVELA DAS OITO OU NOVE DAS BOAS. Por incrível que pareça, perdemos a escritura da nossa casa dentro da nossa própria casa. Minha família se mobilizou para acha-la e a cada envelope novo que encontrávamos, uma nova surpresa e uma nova decepção. Para ficar caricato e mais improvável, faltava somente um sambinha toda vez que alguém fazia cara de “também não está aqui”.

Enquanto eu procurava, achei pérolas e raridades que jamais havia visto: antigos bilhetinhos de amor trocados por meus pais, os boletins escolares de ambos, exames de sangue, garantias de produtos diversos o manual de uma velha máquina de lavar um guia ensinando a tirar fotografias “como um profissional” a antiga câmera fotográfica da família que supostamente tirava fotografias profissionais uma flauta e umas cartas de tempos imemoriais enviadas para diversos endereços diferentes, já que moramos em diversos endereços ao longo da vida; e nada de escritura.

Não sei como nunca perdemos outra escritura! Justo na casa atual, a que nos abriga há mais primaveras e verões, falhamos miseravelmente assim. A caça ao tesouro deu como frutos teorias sobre a casa e sobre o paradeiro da escritura: “Esse guarda-roupa tem umas fendas meio esquisitas, né? Com certeza a escritura escorregou e se enfiou numa delas. Vamos ter que desmontar o guarda-roupa. Pronto! É isso!” – minha mãe. “Não está aqui. Estamos procurando como loucos e a bendita não está aqui” – outra vez minha mãe. “Nunca existiu uma escritura!” – pela terceira vez minha mãe. “Amanhã a gente procura isso direito” – meu pai. “Ou quando não estivermos procurando a escritura aparece” – encerrou sabiamente as explorações, minha mãe.

Ainda bem que estávamos procurando a escritura por um motivo razoável e não por vingança ou por disputar uma herança. Às vezes a vida vira uma novela e permanece com o gosto de sobriedade e de realidade, por que às vezes é bom viver o que as atrizes e os atores fazem parecer tão distante. Para quem diz que a arte imita a vida e a vida imita a arte, um abraço e um beijo molhado da TV aberta, onde a arte imita a arte e a vida imita a vida. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário