O
CALOR VERDADEIRO É AQUELE QUE TE AGRIDE. Estou sendo atacado de todos os lados
por essa força impiedosa e intransigente. Não adianta ventilador, ar
condicionado, banheira de gelo. Ele está por toda parte, por que Ele é
onipresente e onipotente. O calor me atinge como concreto arremessado na
barriga. E dói, como dói!
A
boca do estômago está com gosto de fel e o leite azeda no caminho da geladeira
à mesa. O ovo frita instantaneamente na queda entre casca e asfalto. Assim não dá. Meu nariz sangra ao pensar em garotas de biquíni e,
durante a madrugada, a hemorragia vem da secura do verão sem fim. O suor não
escorre da minha testa, escorre de outros suores, e quem dera fossem somente
meus. Os fluidos corporais das pessoas estão se propagando para todos os
lugares e não somem, ficam impregnados. É impressionante. Na academia, por exemplo,
as paredes estão suando – ou chorando.
Assim
não dá. Adoro o Verão, estava até contando os dias para o início do mesmo junto
com uma página de Facebook do Rio de Janeiro, e quero, inclusive, que ele fique
mais que três meses conosco, contudo está faltando um pouco de discrição por
parte dele. Desde o solstício que não durmo direito. O ventilador faz muito
barulho, atrapalha o sono. Desligo. O calor me ataca mais rispidamente. Acordo.
Ligo o ventilador. Não durmo. Sinto calor, porque desliguei o ventilador mais
uma vez. O sol nasce. É implacável demais.
Alguém,
por favor, diga ao Verão que não é a visita quem faz a recepção calorosa, são
os anfitriões sorridentes. E se ele, Verão Sem Fim, quiser companhia viva e em
forma sólida, ele, Magnífico, vai ter que diminuir a potência dos raios UV e a
temperatura desse forninho-elétrico chamado Terra, codinome Inferno na Terra
que podemos chamar só de Inferno mesmo.
Aceite
bem essas críticas, tá bem, Poderoso. Uma hora, irá embora e vai chegar o
Outono, que é mais seco. Veja bem. Ainda gosto de você. Peço somente menos
alegria, menos estardalhaço. Ninguém quer o seu mal, assim como ninguém precisa
ficar mal. E tem outra, você não vai ser nem abandonado nem esquecido. Nunca! Jamais!
Quem te viu, viu; os que perderam, outrora ainda verão. Bem-vindo. Qualquer
quantidade de protetor solar ainda não é suficiente. Não se acanhe, fique à
vontade. A casa é sua. Março ainda demora a chegar.




